domingo, 27 de março de 2011

Cartas ao sabor do vento

Entrei numa fase em que acho tudo muito chato e sem brilho. É claro que para chegar até esse ponto, percorri mundos e experimentei ilusões que me permitiram chegar a tão infausta conclusão. Logo eu, que saiu daquele grupo de crianças felizes do subúrbio carioca de outrora. Moleque de rua, levado, que fugia das merecidas chineladas, refugiando-me na casa da árvore. Membro promissor de uma família tecnicamente ajustada para os padrões da época. Configuração clássica: com papai, mamãe, irmãos, primos, amigos de escola e tal. Depois cresci, estudei, namorei, casei e tive filhos.

Após uma jornada feliz, agora pra lá dos 40, acho tudo muito sem graça. Atribuo a essa fase nefasta, da qual espero me livrar em breve, a morte do meu pai, no final do ano passado. Ele foi prova de como a vida pode se tornar patética. Meu pai foi a famigerada ovelha negra dos seis filhos do Capitão Mello. Tal qual o pai, também foi fuzileiro, mas inapropriadamente aventureiro, e um tantinho irresponsável, inconseqüente e intempestivo: qualidades que não o impediram de defender o leite santo de cada dia. Personificou a figura do malandro carioca, falador, falastrão, que gostava de levar vantagem em tudo. Encarava com bom humor todos os percalços que o destino lhe proporcionou. Oito anos após perder a amada esposa, companheira de tantos e tantos anos, passou a viver com uma grave seqüela decorrente de um AVC isquêmico, que limitou parte dos movimentos do corpo e lhe roubou as propriedades da fala, da qual tinha grande orgulho.

Durante os 12 anos em que passou viúvo até morrer, meu pai viveu perdidamente triste, cabisbaixo, deprimido e, certamente, saudoso dos tempos em que brilhava nos campos de futebol de Éden e de toda a Baixada Fluminense. Dos tempos em que enchia o fusquinha de crianças para passar férias nas cidades de Vera Cruz e Miguel Pereira, berço de mamãe. Dos tempos em que chegava com balas e doces, e as arremessava de “avanço” para todos nós.

Sei que tais recordações são o motivo de tanta sorumbatice desses dias. Receio ter me transformado em um homem desencantado e um tanto receoso quanto a existência de um futuro benfazejo. Passei a acreditar que todo o processo pelo qual se ergue uma vida inteira está fadado a desmoronar como um castelo de cartas ao sabor do vento. O que me consola, às vezes, é contar com um tênue fio de esperança de que serão bem aventurados os homens que dominam a arte de empilhar cartas.

6 comentários:

  1. CONSELHO (Jorge Aragão)

    Deixe de lado esse baixo astral
    Erga a cabeça enfrente o mal
    Que agindo assim será vital para o seu coração
    É que em cada experiência se aprende uma lição...

    ...Tem que lutar
    Não se abater
    Só se entregar...

    P.S.: Viva a felicidade dos seus filhos e esposa, isso nos dá força pro amanhã.

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  2. É como o ditado diz
    O meu conselho é pra te ver feliz.

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  3. A cada dia vivemos uma experiencia diferente. Algumas deixam marcas, outras nem tanto. Na vida, temos que ter o discernimento de separar com razão as nossas experiencias. E, o que deve ser primordial, saber repassá-las aos nosso herdeiros. Acredito que, a herança deixada pelo Leopoldinho foi muito boa. Não dê foco apenas nas ausências mas ilumine os bons momentos. São eles que fazem essa merda de vida ficar um pouco melhor. Acredite no amor dos seus filhos e de sua mulher, são para eles os bons momentos que você irá deixar como herança. Saiba que, daqui do Rio de Janeiro, torcemos por você e por sua familia. Nessa vida, você não está sozinho. Do seu querido, lindo e maravilhoso padrinho. Beijos a todos.

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  4. Achei a sua CARTAS AO SABOR DO VENTO uma declaração de amor ao nosso querido Leopoldinho, como fala seu padrinho. Lembre-se sempre do seu pai como um homem que veio ao mundo para acertar e errar, nós todos somos assim. Ele amou muito a familia, do modo dele.
    Agora acredite nas pessoas que te amam de verdade, eu, Gabriel e Beatriz. E saia dessa fase sem brilho da sua vida, pois não combina com voce.
    Beijos de sua neguinha.

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  5. Querido Larry,

    "CARTAS AO SABOR DO VENTO"... Texto melancólico (o que não combina muito com você, não é?! rsrs), porém é de uma sensibilidade e demonstração de amor incríveis. Por favor, receba minha condolência pela perda de seu paizinho.

    Perdi meu pai em 2004 e, por isso, entendo perfeitamente quando diz que "a vida pode se tornar patética". A verdade é que a vida nos surpreende a cada instante, a cada minuto... E que, de fato, precisamos estar "preparados" para enfrentar os percalços e os infortúnios com bom humor e leveza (entendo que, na maioria das vezes, encontrar esse equilíbrio é difícil, mas precisamos tentar). Recomendo que você guarde de seu paizinho somente lembranças doces, o que certamente trarão de volta a sua alegria, o seu lindo sorriso e bom humor. Gosto muito de um texto de Charles Chaplin cujo título é "Depende de mim". Leia-o com carinho! Espero que Deus, nosso Paizinho Celestial, conforte o seu coração e o de sua família. Que Deus esteja SEMPRE ao ladinho de cada um de vocês!!

    DEPENDE DE MIM(Charles Chaplin)

    Hoje levantei cedo pensando no que tenho a fazer antes que o relógio
    marque meia-noite.
    É minha função escolher que tipo de dia vou ter hoje.
    Posso reclamar porque está chovendo... ou agradecer às águas por
    lavarem a poluição.

    Posso ficar triste por não ter dinheiro... ou me sentir encorajado para administrar minhas finanças, evitando o desperdício.

    Posso reclamar sobre minha saúde... ou dar graças por estar vivo.

    Posso me queixar dos meus pais por não terem me dado tudo o que eu queria.... ou posso ser grato por ter nascido.
    Posso reclamar por ter que ir trabalhar.... ou agradecer por ter trabalho.

    Posso sentir tédio com as tarefas da casa... ou agradecer a Deus por ter um teto para morar.
    Posso lamentar decepções com amigos... ou me entusiasmar com a possibilidade de fazer novas amizades.

    Se as coisas não saíram como planejei, posso ficar feliz por ter hoje para recomeçar. O dia está na minha frente esperando para ser o que eu quiser.

    E aqui estou eu, o escultor que pode dar forma.

    Tudo depende só de mim."

    Beijinho carinhoso e inté!

    Cuide-se e fique com Deus!

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  6. Omar Machado de Freitas8 de abril de 2011 às 21:23

    Meu cunhado, irmão Larry,
    Nestes longos e bons anos de existência, os quais 16 deles vividos e convividos na sua família, já tive momentos de tremenda luta pessoal.
    E foi numa destas, que veio a maior e digo com toda franqueza, salvação para estar vivo com vocês ate hoje. O conhecimento de uma bússola, a qual me trouxe novamente a direção e a vontade de rever meus preceitos de vivencia ate aquele momento, A Bíblia.
    Pois nela encontrei forças, e Ela, também me deu o conhecer de querer não é poder, mas sim de deixar direcionar por um Deus que tudo pode, para e em nós.
    Sei que, no momento da escrita deste texto, expressou mais o teu Pai porque foi o mais recente, por isto faz mais efeito, mas as coisas que guardamos no nosso dia a dia nos pesam tanto que, se não apagarmos de nossas vidas, tornará um instrumento tipo martelo para nos enterrar a cada momento em maus pensamentos.
    Por isso quero deixar a você um bilhete o qual apostolo Paulo escreve:
    Filipenses cap. 4:
    11 Não digo isto por causa de necessidade, porque já aprendi a contentar-me com as circunstâncias em que me encontre.
    12 Sei passar falta, e sei também ter abundância; em toda maneira e em todas as coisas estou experimentado, tanto em ter fartura, como em passar fome; tanto em ter abundância, como em padecer necessidade.
    13 Posso todas as coisas naquele que me fortalece.

    Olhe para aquele que realmente pode te fortalecer, e observe a sua bela família e amigos, então veras que em meio a lutas, tristezas e alegrias, encontraras motivo para continuar feliz.

    Beijos de sua família Linomarcarol.
    Omar

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