domingo, 8 de março de 2009

A alma do negócio


Nunca antes na história recente deste país ninguém precisou tanto de um carro zero. As mulheres nunca precisaram tanto de roupas, sapatos, bolsas e bijuterias. Os homens nunca tomaram tanta cerveja, assistiram a tantos jogos de futebol. As crianças nunca comeram tantas batatas fritas, hambúrgueres e beberam tanto refrigerante. Nunca se ouviu tanta música e nem tanta fofoca. Nunca se viu tanto filme, tanta novela e tanto Big Brother. Nunca se comprou tantos celulares, notebooks, TVs tela-plana, mp3, mp4, mp5... Nunca gastamos tanto e nunca estivemos expostos a tanta propaganda.

É evidente que a Publicidade presta um grande serviço à saúde da economia. Mais do que o trabalho de planejar campanhas de marketing, desenvolver propagandas e estratégias de mercado, a atividade assume grande relevância no processo de formatar o padrão de consumidores. A Publicidade identifica o perfil dos compradores e os coloca em verdadeiros pacotes, para atuarem em distintos nichos, com a tarefa de comprar e fazer circular o capital que alimenta a máquina econômica.

Ciência - Publicidade é uma atividade considerada sistêmica, científica, dinâmica, de ação continuada, massificante e arquitetada para disseminar o vírus do consumo, cujo princípio ativo é despertar no indivíduo a vontade, o desejo de possuir, de aparecer, de exibir bens e status, de ser partícipe de uma sociedade atuante.

O psicólogo americano Abraham Maslow desenvolveu um estudo sobre isso, denominado Teoria da Motivação. Para o cientista, as necessidades humanas são hierarquizadas, a partir das coisas mais urgentes para as menos urgentes. Dessa forma, a prioridade para todo indivíduo advém da necessidade fisiológica, como a fome, a sede e a não-dor. Depois, surgem outras carências, como a necessidade de segurança, seguida da necessidade social, do convívio em grupo.

Até então, para agir sobre essas necessidades, a Publicidade não despende muito esforço, pois esses estímulos são despertados automaticamente pelo próprio indivíduo. A partir daí surgem, segundo Maslow, as necessidades do ego e da auto-realização. Terreno fértil para a ação da Publicidade. A propósito, no filme Advogado do Diabo, a vaidade é o pecado favorito do diabo. "Vanity! Definitely my favorite sin". É pela vaidade que o diabo consegue seduzir as almas.

De fato, a Publicidade exerce sobre a mente humana um processo diabólico. Claro, que eu falo daquele gesto de “buzinar” no ouvido do pobre mortal, incentivando-o a cometer pequenos e grandes pecados. Tecnicamente, uma das definições da publicidade é a arte de exercer ação psicológica sobre o público com fins comerciais. A Publicidade não cria e nem muda comportamentos ou tendências, apenas rega a semente da plantinha do mal que todos já possuímos interiorizada.

Apesar de diabólica, a atividade não tem nada de maldosa. Muito pelo contrário. É importante para desenvolvimento do modelo de produção capitalista, no qual estamos inseridos e, portanto, sujeitos aos seus princípios e controles. O trabalho silencioso da Publicidade produz lucros estrondosos, com cifras freqüentando a casa dos bilhões. As empresas investem muito, pois o retorno é líquido e certo. Afinal de contas, a propaganda é a alma do negócio. No entanto, é bom deixar claro: ninguém precisa vender a alma para satisfazer os sonhos de consumo.

3 comentários:

  1. Muito bem abordado o uso das necessidades básicas, propostas por Maslow, com a publicidade. Cabe ressaltar que os mecanismos de atuação da propaganda, usando essas necessidades, são praticamente imperceptíveis pelo ser humano, cabendo ao propagandista a responsabilidade de agir de forma ética.

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  2. Comentário anarquista:

    "Apesar de diabólica, a atividade não tem nada de maldosa. Muito pelo contrário. É importante para desenvolvimento do modelo de produção capitalista."

    Capitalista? então, sim. É diabólico! rs!

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  3. Larry, parabéns pela simplicidade, inteligência e elegância com que escreve! Gostei muito dos texos. Parabéns!

    Bernardo

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